Lauro Parente – Economista e fundador do Canal Arbitragem.

Olavo Augusto Vianna Alves Ferreira – Doutor e mestre em Direito pela PUC/SP, Procurador do Estado de São Paulo, Professor de Direito, Autor de livros sobre Arbitragem e Direito Constitucional. Coordenador Acadêmico do Canal Arbitragem.

 

A lei de arbitragem completa 27 anos, e temos muito a comemorar, já que o balanço é deveras positivo, com um grande crescimento da sua aplicação, além da evolução da doutrina.

O crescimento da adoção da arbitragem é relatado anualmente pela pesquisa coordenada anualmente pela Professora Selma Lemes em parceira com o Canal Arbitragem, certo de que a última concluída em 2023, referente ao ano de 2022 relata, dentre outros pontos, que destacamos:

“Em 2005, havia apenas 21 processos arbitrais, que tinham em jogo R$ 247 mil. Uma década depois, em 2015, eram contabilizados 222 novos casos, somando R$ 10,7 bilhões. Já em 2021 e 2022 foram registrados 658 novos procedimentos, em um total de R$ 95 bilhões”[1];

“Somente as agências reguladoras são parte em 22 casos, que, juntos, têm mais de R$ 500 bilhões em jogo, segundo dados da Advocacia-Geral da União (AGU)”[2], além das arbitragens que temos a União como parte e os demais entes federativos;

“se considerarmos exclusivamente o universo das arbitragens em que a Administração Pública Direta e Indireta foi parte conclui-se que houve um aumento de 33% no setor em 2022 (27 casos em 2021 para 36 em 2022)” [3];

“O ano de 2022 manteve o que se verificou em 2021, demonstrando que as impugnações de árbitros representam percentual pequeno (menos de 5%) diante do número de arbitragens processadas (1116). Ademais se falarmos de impugnações aceitas esse percentual representou menos de 1% (0,99%)”[4].

A conclusão da Professora Selma Lemes:

“São números expressivos. Mostram que a arbitragem está consolidada e incorporada nos contratos” [5].

A evolução na prática é permanente nas Câmaras com alterações nos seus regulamentos, buscando aprimoramento constante, além do aumento das listas referenciais de árbitros, com ingresso de novos profissionais.

Este crescimento encontra respaldo nas decisões judiciais.

A jurisdição arbitral é prestigiada pela interpretação do Superior Tribunal de Justiça, tanto que Ministros da Corte da Cidadania destacam o crescente papel da arbitragem como mecanismo de solução de conflitos[6], adotando sua natureza jurisdicional[7] e prestigiando o princípio da competência-competência[8], dentre outros temas.

[1]. https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2023/09/08/arbitragem-bate-recorde-com-bilhoes-de-reais-em-disputa.ghtml .

[2]. https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2023/09/08/arbitragem-bate-recorde-com-bilhoes-de-reais-em-disputa.ghtml .

[3]. Pesquisa:  Arbitragem em números. Selma Lemes. 2023 (no prelo).

[4]. Pesquisa:  Arbitragem em números. Selma Lemes. 2023 (no prelo).

[5]. https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2023/09/08/arbitragem-bate-recorde-com-bilhoes-de-reais-em-disputa.ghtml .

[6] Conforme notícia intitulada “A jurisdição arbitral prestigiada pela interpretação do STJ”, extraída do site do Superior Tribunal de Justiça, disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/A-jurisdicao-arbitral-prestigiada-pela-interpretacao-do-STJ.aspx , acesso em 08/06/2021.

[7] Trata-se da posição adotada pelo Superior Tribunal de Justiça, STJ, 2.ª Seção, CC n.º 113.260/SP, Min. João Otávio de Noronha, j. 08.09.2010, DJ 07.04.2011. No mesmo sentido vide: “PROCESSO CIVIL. ARBITRAGEM. NATUREZA JURISDICIONAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA FRENTE A JUÍZO ESTATAL. POSSIBILIDADE. MEDIDA CAUTELAR DE ARROLAMENTO. COMPETÊNCIA. JUÍZO ARBITRAL. 1. A atividade desenvolvida no âmbito da arbitragem tem natureza jurisdicional, sendo possível a existência de conflito de competência entre juízo estatal e câmara arbitral. 2. O direito processual deve, na máxima medida possível, estar a serviço do direito material, como um instrumento para a realização daquele. Não se pode, assim, interpretar uma regra processual de modo a gerar uma situação de impasse, subtraindo da parte meios de se insurgir contra uma situação que repute injusta. 3. A medida cautelar de arrolamento possui, entre os seus requisitos, a demonstração do direito aos bens e dos fatos em que se funda o receio de extravio ou de dissipação destes, os quais não demandam cognição apenas sobre o risco de redução patrimonial do devedor, mas também um juízo de valor ligado ao mérito da controvérsia principal, circunstância que, aliada ao fortalecimento da arbitragem que vem sendo levado a efeito desde a promulgação da Lei nº 9.307/96, exige que se preserve a autoridade do árbitro como juiz de fato e de direito, evitando-se, ainda, a prolação de decisões conflitantes. 4. Conflito conhecido para declarar a competência do Tribuna Arbitral”, (STJ – CC: 111230 DF 2010/0058736-6, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 08/05/2013, S2 – SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 03/04/2014). Recentemente, reiterou o STJ este entendimento: “AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA. INCIDENTE MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. JUÍZO ARBITRAL E JUÍZO ESTATAL. ARBITRAGEM. NATUREZA JURISDICIONAL. MEIOS ALTERNATIVOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITO. DEVER DO ESTADO. PRINCÍPIO DA COMPETÊNCIA-COMPETÊNCIA. PRECEDÊNCIA DO JUÍZO ARBITRAL EM RELAÇÃO À JURISDIÇÃO ESTATAL. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Segundo a regra da Kompetenz-Kompetenz, o próprio árbitro é quem decide, com prioridade ao juiz togado, a respeito de sua competência para avaliar a existência, validade ou eficácia do contrato que contém a cláusula compromissória, nos termos dos arts. 8º, parágrafo único, e 20 da Lei nº 9.307/1996. 2. O caráter jurisdicional da arbitragem, decorrente da regra Kompetenz-Kompetenz, prevista no artigo 8º da lei de regência, impede a busca da jurisdição estatal quando já iniciado o procedimento arbitral, operando-se o efeito negativo da arbitragem previsto no art. 485, VII, do NCPC. 3. Na hipótese dos autos as informações prestadas pelo Juízo Arbitral dão conta de que, além de se pronunciar sobre a sua própria competência com a efetiva verificação da cláusula compromissória existente no contrato celebrado entre as partes, foi comprovada a alteração de sua denominação social com a juntada do documento respectivo. 4. Agravo interno não provido” (STJ – AgInt nos EDcl no AgInt no CC: 170233 SP 2019/0386014-7, Relator: Ministro MOURA RIBEIRO, Data de Julgamento: 14/10/2020, S2 – SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 19/10/2020). O Tribunal Constitucional de Portugal adota a tese da natureza jurisdicional da arbitragem, vide Acórdãos nºs 230/86, 52/92, 506/96, 181/2007, 42/2014.

[8]    .         STJ – CC: 139519 RJ 2015/0076635-2, Relator: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 11/10/2017, S1 – PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 10/11/2017. No mesmo diapasão: “1. A controvérsia instaurada no recurso especial, retido na origem, consiste justamente em saber se há cláusula de convenção de arbitragem, circunstância que, caso reconhecida, tem o condão de derrogar, a princípio, a própria jurisdição estatal, de modo a tonar inócua toda a atividade que venha a ser desenvolvida no processo. 1.1. A simples constatação de previsão de convenção de arbitragem – objeto de discussão no recurso especial – enseja o reconhecimento da competência do Juízo arbitral, que, com precedência ao Poder Judiciário, deve decidir, nos termos do parágrafo único da Lei de Arbitragem (Lei n. 9.307/96), de ofício, ou por provocação das partes, as questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a cláusula compromissória. Precedentes…      1.3 Ressai evidenciado, assim, a necessidade de se exaurir, com precedência de qualquer outra questão, a discussão acerca da existência de convenção de arbitragem, a considerar que a verificação desta, como assinalado, tem o condão de tornar inútil, a princípio, a atuação jurisdicional do Estado.” (AgRg no AREsp n. 371.993/RJ, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 14.10.2014). “Pedido de decisão liminar em conflito de competência relativo a ação declaratória de nulidade da participação da União Federal em procedimento arbitral e o respectivo procedimento, que trata de indenização decorrente da Operação “Lava-Jato”. Alegação de que a União, na qualidade de acionista controladora, não vincula-se à cláusula compromissória do Estatuto da Petrobrás. Questão que poderá ser apreciada apenas após decisão do Tribunal Arbitral que ainda não foi instituído. Princípio Kompetenz-kompetenz. Impossibilidade de definição do conflito de competência”, STJ, CC 151.130, j. 07.05.2018, monocrática. Igualmente no STJ: HDE 120/EX, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em 18/12/2018, DJe 12/03/2019; AgInt no AREsp 425955/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/02/2019, DJe 01/03/2019; REsp 1678667/RJ, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 06/11/2018, DJe 12/11/2018; CC 150830/PA, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 10/10/2018, DJe 16/10/2018; Rcl 36459/DF, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 26/09/2018, DJe 05/10/2018; AgInt no CC 156133/BA, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/08/2018, DJe 21/09/2018 (Vide Informativo de Jurisprudência N. 622).

[1] TJ-GO – APL: 00082351920178090006, Relator: ORLOFF NEVES ROCHA, Data de Julgamento: 02/05/2018, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 02/05/2018; TJ-ES – APL: 00130471420168080024, Relator: ÁLVARO MANOEL ROSINDO BOURGUIGNON, Data de Julgamento: 02/10/2018, SEGUNDA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 06/12/2018; TJ-MG – AC: 10223150104873001 Divinópolis, Relator: Arnaldo Maciel, Data de Julgamento: 12/09/2017, Câmaras Cíveis / 18ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 15/09/2017. TJ-SP – AI: 21383951120188260000 SP 2138395-11.2018.8.26.0000, Relator: Ricardo Negrão, Data de Julgamento: 25/02/2019, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 27/02/2019. Igualmente vide: TJSP, 14ª Cam Dir Priv, AI 2219052-76.2014.8.26.0000, j. 15.04.2015, unânime; e TJSP, 2ª Cam Res Dir Emp, AI 2223333-36.2018.8.26.0000, j. 30.11.2018, unânime.

[2]. TJSP, 2ª Cam Res Dir Emp, AI 2112321-56.2014.8.26.0000 , j. 05.12.2014, unânime. TJMG, 21ª CC, Apel 5089571-50.2021.8.13.0024, j. 11.09.2023, unânime; TJMG, 21ª CC, Apel 5171400-53.2021.8.13.0024, j. 11.09.2023; TJSP, 2ª Câm Res Dir Emp, Apel 1007937-03.2022.8.26.0510, j. 23.05.2023, unânime;TJMG, 21ª CC, Apel 5161239-81.2021.8.13.0024, j. 04.05.2023, unânime; TJDFT, 7ª T. Cível, Apel 0704280-87.2022.8.07.0015, j. 27.04.2023, unânime; TJMG, 21ª CC, Apel 5161255-35.2021.8.13.0024, j. 20.04.2023, unânime; TJRJ, 6ª Câm Dir Priv, Apel 0194609- 43.2021.8.19.0001, j. 23.03.2023, unânime;TJRJ, 11ª CC, Apel 0043025-97.2020.8.19.0021, j. 31.01.2023, unânime; TJMG, 21ª CC, Apel 5171441-20.2021.8.13.0024, j. 25.11.2022, unânime; TJMG, 21ª CC, Apel 5095656-52.2021.8.13.0024, j. 17.08.2022, unânime; TJSP, 2ª Câm Res Dir Emp, AI 2214340-96.2021.8.26.0000, j. 10.05.2022, unânime;TJSP, 1ª Câm Res Dir Emp, AI 2218234-80.2021.8.26.0000, j. 31.01.2021, unânime; TJSP, 1ª Câm Res Dir Emp, Apel 1000316-60.2021.8.26.0260, j. 19.08.2021, unânime; TJSP, 2ª Câm Res Dir Emp, Apel 1054404-85.2017.8.26.0002, j. 03.02.2020, unânime; TJSP, 2ª Câm Res Dir Emp, Apel 1012360-45.2017.8.26.0004, j. 31.01.2020, unânime; TJES, 3ªCC, AI 0013950-80.2019.8.08.0012, j. 03.03.2020, unânime;TJDFT, 3ª T., Apel 0736145-15.2018.8.07.0001, j. 25.09.2019, unânime; JRJ, 8ª CC, AI 0047488-53.2017.8.19.0000, j. 30.01.2018, unânime; TJSP, 2ª Cam Res Dir Emp, AgR 2069258-15.2013.8.26.0000, j. 25.08.2015, unânime .

[3] Ap. 1076161.2017 e Ap. 1116375-63.2020.

Os diversos Tribunais de Justiça, da mesma forma, prestigiam muito a arbitragem, principalmente a sua natureza jurisdicional[1] e o princípio da competência-competência[2].

Houve a aplicação das diretrizes da IBA pelo Tribunal de Justiça de SP[3].

Também no âmbito acadêmico o crescimento é impressionante. Há uma quantidade enorme de livros recém-lançados sobre arbitragem, o que não se via até o ano de 2018. Os programas de mestrado e doutorado têm aumentado muito o número de dissertações, teses e artigos jurídicos sobre o tema.

Os eventos que discutem arbitragem têm recebido uma audiência cada vez maior, e discutem todos os aspectos centrais da arbitragem, sem nunca se furtar a autocrítica e reflexão, imprescindíveis para constante evolução.

Além destes eventos presenciais o Canal Arbitragem, uma plataforma de conhecimento 100% aberta e gratuita, oferece hoje conteúdo de alta qualidade em 3 idiomas, e à partir do Brasil intensifica as trocas da comunidade arbitral internacional. Uma série de programas, alguns deles até com a opinião das partes que contratam a arbitragem,

democratizando o acesso ao conhecimento, integrando especialistas que abordam questões jurídicas de mérito que são relevantíssimas, viabilizando, outrossim, eventos presenciais de altíssimo nível.

A beleza da arbitragem segue na autonomia da vontade das partes e na autorregulação, certo de que esta profusão de debates e discussões são a prova de um mercado sofisticado e especializado.

Enfim, demonstrada a evolução, resta homenagear e agradecer o trabalho inicial e permanente de Carlos Alberto Carmona, Selma Lemes, Pedro Batista Martins e José Emílio Nunes Pinto, dentre tantos outros que lutaram e lutam para a evolução da arbitragem no Brasil.