Judith Martins-Costa**

Caríssimos colegas,

A todos cumprimento nas pessoas de Claudio Scognamiglio e de Fábio Floriano Melo Martins. Agradeço muito ao IDiP pela honra que me concedeu ao incumbir-me das palavras de fechamento de tão exitoso encontro acadêmico. Palavras que intentarão combinar um “relatório de síntese” (para que recordemos as valiosas contribuições que ouvimos nessas duas manhãs) com considerações pessoais sobre o problema da disciplina da responsabilidade civil.

Pensando no que aqui ouvi, ontem e hoje, creio que o fio condutor das palavras pronunciadas nesses dois frutuosos dias de debates fora já traçado por um cidadão romano no século II de nossa Era: honeste vivere, alterum non laedere, suum cuique tribuere.

Recordo essa axiomática fórmula que, de tão repetida ao longo dos séculos, poderia soar como uma platitude, porque me parece conter, com a sabedoria estoica sobrevivente aos séculos, a suma daquele modelo de atribuição ou alocação interpatrimonial viabilizado pelo que chamamos de Direito Privado. E assim o faço porque, no meu modo de ver, o que fizemos, ao mergulhar em problemas cruciais da responsabilidade civil, foi buscar o conteúdo desses supremos preceitos que sintetizam a arché, a substância ou “razão de ser” do Direito Privado.

Assinalo, desde logo, os marcos fundamentais que enquadram a síntese que buscarei traçar: em primeiro lugar, o Direito Privado, esse “espaço significativo de interação humana”, sendo sua precípua função “preencher com a noção de respeito mútuo o espaço privado, ambiente no qual não se pode presumir que as necessidades e os interesses de cada agente serão levados em consideração pelos demais agentes”[1]; em segundo lugar, a responsabilidade civil, conjunto de regras de respeito ao outro, esse genial artefato cuja função primordial (embora não exclusiva) é imputar ao causador de um dano a sua reparação. Alterum non laedere, portanto, e, com honeste vivere – correção e bona fides –, atribuindo a cada um o que é seu (suum cuique tribuere).

Na palestra inaugural, Marcello Maggiolo tratou do dano, esse requisito incontornável do dever de indenizar, perspectivando-o de variados prismas. O racional da responsabilidade civil é o racional do dano e à resposta dada ao dano. Bem assinalando que a noção de dano é – de resto, como todos os conceitos jurídicos – historicamente plasmada e percebida, examinou-o como pressuposto e como objeto da quantificação, tema que convoca análise jurídica e técnica, extrajurídica, não deixando de assinalar fatores políticos que a podem influenciar. E relacionou-o, por fim, às formas de tutela (ressarcitória e inibitória) e à causalidade, pois a adequação causal é balizada pela previsibilidade do dano.

Ao dano seguiu-se o risco, fator de imputação de responsabilidade, tema enfrentado por Ugo Salanitro e por Ana Frazão, sob perspectivas diversas, mas convergentes, em painel que teve a presidência de Vincenzo Roppo.

Salanitro traçou o arco que, na doutrina italiana, vai de Pietro Trimarchi aos impactos da regulação unitária europeia. Ao primeiro – a demonstrar a força da doutrina na formulação de modelos jurídicos hermenêuticos – é devida a assunção do risco típico como critério de imputação de responsabilidade civil, assim propondo colmatar lacuna percebida no Codice Civile. A segunda, versando outro conceito de risco – elaborado no contexto do capitalismo maduro e da revolução digital – veio, a final, preencher a lacuna existente na legislação italiana.

Ana Frazão conjugou ao tema do risco o da inteligência artificial, assinalando quer a complexidade do tema (irredutível a um tratamento exclusivamente dogmático), quer a ressignificação dos termos de uma díade cujos núcleos conceituais pareciam estabilizados, qual seja: os conceitos de risco e incerteza. O primeiro – fator de imputação de responsabilidade – suscetível a um relativo controle e gerenciamento; a segunda tendo ínsita incontrolabilidade. Mas a inteligência artificial veio desafiar essa construção, carreando à responsabilidade civil a concorrência entre os princípios da prevenção (previne-se riscos) e da precaução (adotam-se medidas acauteladoras da incerteza).

De fato, a poliédrica noção de risco suscita, no mais das vezes, uma verdadeira algaravia, quer pela antiga confusão entre risco e perigo[2]; quer pela indistinção entre risco proibido e risco permitido; quer, enfim, pelas conotações entre o risco e o seu objeto, por vezes se confundindo mesmo, na própria responsabilidade civil, o risco com o “fundamento” do dever de indenizar, por outra – tão generalizada que quase prevaleceu na recente proposta de reforma do Código Civil brasileiro[3] –, entre atividade de risco e atividade ilícita.

Como pôr ordem nessa algaravia, tarefa tanto mais necessária quando vivemos não apenas na sociedade do risco (Ulrich Beck)[4], não apenas numa civilização do risco (Patrick Lagadec[5]), mas, talvez, numa sociedade conformadora de “uma outra modernidade”[6] na qual a incerteza (e não só o risco) se tornou uma inerência às interações sociais?

Nessa temática, as dúvidas se sobrepõem às certezas. No comentário de Salvatore Monticelli, inspirado por Blade Runner e transmitido por Claudio Scognamiglio, foi versado o também tormentoso problema da informação. Monticelli abordou o tratamento algorítmico dos dados, produzindo regras permissivas da coleta e disciplina do mercado das informações, alertando aos riscos conectados à essa coleta, que impactam nas escolhas de consumo e até mesmo na adoção de políticas públicas. E situou o problema da “autonomia” da inteligência artificial que, cada vez mais, opera com interatividade, autorregulação e adaptabilidade, resultando em imprevisibilidade e independência de elementos externos, o que, para o Direito, traz a questão, ainda irresoluta, de determinar-se a autoria do causador dos danos que possam produzir.

Giulio Ponzanelli e Elena Gomes averiguaram a noção de dano, tendo Leysser León como debatedor e a presidência de Wanderley Fernandes.

Ponzanelli versou o sempre conturbado tema do dano não patrimonial, traçando sua evolução no cenário italiano e alertando quer às dificuldades na sua liquidação, quer aos perigos da adoção de um sistema “no fault”, por si ilusório, para além de populista.

Já Elena Gomes, com finura comparatista, apontou a inutilidade – para não dizer, a impertinência – do transplante, para o solo jurídico brasileiro, da categoria do dano existencial, já que, no Direito brasileiro, a responsabilidade civil vem plasmada legislativamente em cláusulas gerais.

Encerrou essa sessão Leysser León, que enunciou seu discurso questionando: “Qual a finalidade de propor categorias e classificações dos danos, misturando as mais diversas tradições?”. Essa é uma pergunta fundamental. É claro – e assim reconhece o Professor peruano – que a intervenção legislativa é frequentemente solicitada frente à realidade sul-americana para conter o campo do dano aquiliano ressarcível. Certamente essa intervenção pode ser necessária para solver debates entre doutrina e jurisprudência. Mas a análise in concreto do resultado dessas experiências, especialmente no acolhimento do “dano ao projeto de vida”, não aponta ao seu sucesso – ao menos é assim no Peru, como noticiou –, e, ouso dizer, também assim no Brasil.

De “outros remédios” trataram, na manhã de hoje, Arianna Fusaro e Cristiano Zanetti, com o debate proposto por Nicola Rizzo e sob a presidência de Manuela Mantovani.

Restaram claras, na palestra de Arianna Fusaro, a centralidade do dano e a persistência de sua função principal, qual seja, a reparatória. A Professora abordou outras formas de reparação: aquela que se dá por meio de uma renda vitalícia, com a “redescoberta”, pela jurisprudência, do art. 2057 do Codice Civile; o ressarcimento em forma específica, notadamente no dano ambiental, o que não excluiu reparações complementares, não pela compensação econômica, mas pela lógica da reintegração. Mesmo explorando inovações transcorridas no sistema italiano, essas não mudaram o caráter precípuo da função reparatória, que permanece hígido e estável.

Cristiano Zanetti tratou da responsabilidade contratual e de mais um transplante jurídico, qual seja, o da cláusula sole remedy para contratos regidos pelo direito interno. Dentre os problemas suscitados por esse transplante (sem a observância dos necessários formantes, para lembrar as inesquecíveis lições de Rodolfo Sacco[7]) está o da anulabilidade. É possível afastar a anulabilidade por erro? Talvez esse defeito não tenha, contra a cláusula, força invalidante. Mas e se o defeito for o dolo? Nesse caso, a invalidade se impõe – no Brasil e em outros sistemas –, em atenção ao valor traduzido em outro axioma: fraus omnia corrumpit. E se o problema for a resolução por inadimplemento? Essa poderia ser congelada pela cláusula sole remedy? Essa questão resulta em resposta mais nuançada, menos nítida do que a primeira, relativa aos defeitos do negócio jurídico: prima facie, a cláusula é válida, mas deve vir controlada por critérios de justiça substancial.

Nicola Rizzo tratou do complexo problema da prova do dano, especialmente por presunções, e, consequentemente, da juridicização do raciocínio inferencial – quer quanto ao dano, quer quanto ao nexo causal, que suscita quase sempre uma prova presuntiva. Exemplificou com o dano à reputação e a sua prova, tema complexo, sempre a convocar, em tema de nexo causal, a conjugação entre o raciocínio in abstrato e in concreto, inclusive para discernir o que atinge a esfera patrimonial e a não patrimonial do sujeito.

Do dificílimo problema da causalidade se ocuparam, por fim, Fabrizio Piraino e Lilian San Martín, questionados por Paulo Dóron de Araújo, sob a presidência da Desembargadora Claudia Tabosa Pessoa.

Fabrizio Piraino começou por criticar – com razão – a indevida ampliação funcional da responsabilidade civil, instituto que não é remédio para todos os males, afirmando a necessidade de um exame sério e analítico do nexo de causalidade. E apresentou três postulados: (a) o juízo causal se desenvolve sobre um esquema lógico desenvolvido em dois níveis, o da causalidade geral (abstrato) e o da causalidade específica (concreta); (b) o enquadramento do papel da probabilidade, tanto mais controverso pela polissemia da palavra “probabilidade”; e (c) a necessidade da distinção entre os planos da causalidade geral e da causalidade individual.

O tema é da maior relevância dadas as proposições de inclusão de um “nexo causal probabilístico” em letra de lei, sabendo-se das dificuldades – para dizer o mínimo – de serem conjugados ou superpostos os conceitos de causalidade e de correlação probabilística, noções já apodadas por Michele Taruffo, a justo título, como “antipódicas”[8]. São comuns, ainda, as confusões entre culpa e causa; entre “probabilidade” como figura da linguagem comum, da linguagem jurídica e da linguagem científica[9]; e mesmo se verificando, ali e acolá, incorreta equiparação entre “probabilidade” e “verossimilhança”[10], para além de se encontrar confusões entre espécies distintas, por exemplo: entre causalidade geral e causalidade específica, ou entre probabilidade quantitativa e a probabilidade qualitativa, espécies que admitem subdivisões.

O viés de Lilian San Martín foi o da causalidade de danos causados por eventos naturais – desastres como já vimos (recorde-se Brumadinho e Mariana) e, infelizmente, continuaremos a ver, dadas as agressões contínuas ao meio ambiente e o descaso em sua preservação. Com profundidade, versou especificidades que envolvem, no campo ambiental, os fenômenos da concausalidade e do caso fortuito, e concluiu alertando para a inadequação do instituto da responsabilidade civil para remediar os danos ambientais.

Por fim, Paulo Dóron de Araújo, debatedor, traçou distinções (sempre tão imprescindíveis) no âmbito da responsabilidade da empresa, destacando a relevância da correlação entre risco e a atividade concretamente exercida. Exemplificando com um “óleo de cozinha absolutamente não confiável”, apontou às projeções na causalidade que acidentes com esse produto podem gerar. E concluiu propondo uma análise da responsabilidade da empresa cujo eixo esteja na matriz de riscos, segundo a qual quanto maior for o poder de administração, mitigação ou evitabilidade do dano, mais rígido deve ser o regime de responsabilidade da empresa por danos, pois este é essencialmente dinâmico, a depender da escala de proximidade entre o dano e o produto.

* * *

Dessas ricas exposições e debates, o que deve restar em nossa memória? Como correlacionar o que ouvimos com aqueles substanciais preceitos de razão com os quais iniciei este discurso, enunciados há 19 séculos por um Ulpiano imbuído da ética ciceroniana?

Seria o Direito Privado suscetível a um mero fiat lex, bastando a emergência de um comando legal que pode ser súbito, disruptor, fonte de dúvidas e perplexidades? Ou, ao revés, o Direito Privado e seus institutos fundamentais careceriam, por parte do legislador, da “coragem da moderação” (“il coraggio della moderazione”, como recordo do estudo de Paolo Grossi sobre Vittorio Polacco[11])?

Bem alertou Claudio Scognamiglio em suas palavras inaugurais, na manhã de ontem, para a hybris do legislador. E penso ter integral razão. Essa “coragem da moderação”, para além da barreira contra o risco da entropia do sistema, parece-me ser a conduta mais adequada para o tratamento legislativo da responsabilidade civil que, como todos os institutos jurídicos, se encontra assentada numa ideia de continuidade dinâmica, resultante da necessariamente cuidadosa observação do segredo da experiência histórica na qual nasce, vive, se desenvolve e se transforma.

Essa pergunta e esses alertas revelam preocupações angustiantes quando está em curso uma desnecessária e muito radical mudança do Código Civil, que, em tema de responsabilidade civil, ao invés de pontualmente ajustar, acaso necessário, vem de propor a revogação de toda a disciplina desse instituto.

Num rápido exame, computam-se pelo menos 100 alterações em apenas 28 artigos – entre os artigos 927 e 954 que tratam do dever de indenizar[12] -, sendo essa conta feita apenas pelo número de enunciados normativos modificados (artigo, parágrafo ou incisos), sem necessariamente avaliar quantas regras e princípios potencialmente podem ser acrescidos. Há uma completa subversão na letra, no espírito, na linguagem e no método da Lei Civil[13].

Colegas: não posso, ao findar esse formidável Congresso sobre a responsabilidade civil, eclipsar esse tema. Minha responsabilidade cívica, como civilista que sou, não o permitiria. Se é verdade – como penso que o seja – que a experiência jurídica não é dotada apenas de um nível formal, mas se projeta e legitima na efetividade da vida cotidiana, na concreta experiência da vida social, consequentemente é verdade que não suporta saltos bruscos, sendo efetivada, ao revés, por meio de pequenas, paulatinas e contínuas modificações adaptativas.

E se assim o é, por que mudança tão repentina e drástica em um Código ainda historicamente recente?

Em um Código que, entrado em vigor há 20 anos, não reflete – como é dito sem apoio factual – a realidade normativa dos anos 70 do século XX, pois entre o Anteprojeto apresentado naqueles anos e o Código entrado em vigor em 2002, houve centenas de modificações, quase 500 delas apenas nas rodadas finais de votações, por forma a acolher as principais mudanças normativas das décadas finais daquele século e já do início deste[14].

Pois bem, e numa brevíssima súmula: na disciplina da responsabilidade civil, agora foi introduzida pelos reformadores, por exemplo, em prolixos enunciados, uma “indenização punitiva” (me recuso a dizer “danos punitivos” que, na língua portuguesa, seria um evidente nonsense[15]). E essa indenização punitiva pode levar (como aponta o estudo de Celina Bodin de Moraes, Gisela Sampaio da Cruz Guedes e Tula Wesendonck) não apenas a um bis in idem, mas a um esdrúxulo tetra ou, mais jocosamente, a um “quadri in idem[16].

Mas não só: incorre em confusão entre as fontes do dever de indenizar e do dever de restituir, pois a restituição pelo lucro do interventor, que já estava suficientemente albergada pela cláusula geral do art. 884[17], agora é prevista tanto no regramento dos atos unilaterais[18] quanto no da responsabilidade civil[19]; e ainda resvala em contradições sistemáticas, por exemplo, entre o exercício do direito de regresso previsto tanto no art. 942, § 2º, quanto no caput do art. 945[20].

Outro exemplo da atecnia e da hybris legislativa está na atribuição do critério estatístico para a identificação do dano[21], porta de entrada para utilizar o nexo causal probabilístico, uma via incerta, pois não se sabe onde poderá terminar. Em suma: atribuindo multifunções à responsabilidade civil, falha na função punitiva; falha na função reparatória; e invade o campo das normas processuais ao tratar da função preventiva[22].

A disciplina jurídica estampada num Código – veste formal da experiência jurídica civil – não é suscetível à moda e a modismos; não comporta a acrítica importação de modelos estrangeiros, como se tratasse de importar mercadorias; não é como uma roupa que, num manequim, substitui, em um átimo, o modelo anterior, jogado fora como sem valor. Toda disciplina jurídica é signo de uma cultura e é concretização de concepções de justiça.

Por suas categorias e institutos, o Direito Civil, sendo linguagem normativa e, muitas vezes, performativa, acolhe, funcionalmente, concepções culturais profundas, dentre elas, sobretudo, as concepções de justiça comutativa e distributiva[23]. E assim o faz ao alocar um bem em particular a uma pessoa em particular, e, consequentemente, ao disciplinar as migrações interpatrimoniais e ao estabelecer as suas fontes, entre elas, os danos ilicitamente produzidos no âmbito de relações nas quais estão em causa direitos relativos e direitos absolutos, interesses patrimoniais e interesses extrapatrimoniais.

Mas como pode o Direito realizar suas funções, implementando, por seus institutos e regras, a justiça comutativa e a justiça distributiva, se o sistema positivo de produção normativa não se apresenta, mais, como uma ordem de estabilidade assentada na experiencia da vida civil? Se, ao revés de conjugar, em um sistema, regras de autoridade, consenso social e prática dos cidadãos, acaba por se revelar, ao contrário, como ruptura e incongruência, como fonte de dúvidas e perplexidades? Então, como preservar confiança e segurança, e como assegurar a concretização da justiça?

Ao final deste congresso, confesso que gostaria de ter uma resposta. Mas o momento é de perplexidade, preocupação e profundas dúvidas. Tenho, portanto, que voltar ao início, às palavras inaugurais de Claudio Scognamiglio ao recordar o trabalho paciente da comunidade dos intérpretes e alertar ao grande limite de qualquer tentativa de reforma, introduzida com curto tempo: o risco da entropia do sistema.

Não posso, portanto, senão concluir com esse alerta e com as minhas angustiantes interrogações, que, com humildade, deixo à reflexão de todos.

Tante grazie! Muito obrigada!

* MARTINS-COSTA, Judith. Conferência de Encerramento do Congresso Internacional de Responsabilidade Civil, organizado pelo Instituto de Direito Privado – IDiP e pela Associazione Civilisti Italiani – ACI. In: MARTINS-COSTA, Judith; MARTINS, Fábio; CRAVEIRO, Mariana; XAVIER, Rafael (Orgs.). Boletim IDiP-IEC. Vol. XVIII, Canela-São Paulo, Publicado em 20.05.2024.

** Professora Livre-docente em Direito Civil pela USP.

[1] MICHELON, Claudio. Direito Privado, razão e justiça. São Paulo: Almedina, 2023, p. 124.

[2] SARGENTI, Manlio. Rischio (dir. Rom.). In: Enciclopedia del Diritto. Vol. XL. Milano: Giuffrè, 1989, p. 1.132. Para os dados de ordem histórica, vide: BIROCCHI, Italo. Rischio (dir.interm). In: Enciclopedia del Diritto. Vol. XL. Milano: Giuffrè, 1989, p. 1.134-1.135.

[3] A redação proposta pela Relatoria-Geral em fevereiro de 2024 enunciava: “Art. 187-A. Haverá ilícito independentemente de prova de culpa, quando: I – a atividade, por sua natureza, causar risco; II – a ação de pessoa incapaz causar dano; III – tendo a pessoa o dever especial de evitar o dano, omite-se; IV – do fato da coisa ou do animal derivar dano”. Disponível em: https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento/download/96c9b1da-22f3-4b92-89ff-4e19a1ec2d61.

[4] BECK, Ulrich. Sociedade do risco: rumo a uma outra modernidade. Tradução de Sebastião Nascimento. São Paulo: Editora 34, 2011.

[5] LAGADEC, Patrick. La civilisation du risque. Catastrophes technologiques et responsabilité sociale. Paris: Seuil, Coll. Science Ouverte, 1981.

[6] BECK, Ulrich. Sociedade do risco: rumo a uma outra modernidade. Tradução de Sebastião Nascimento. São Paulo: Editora 34, 2011, com referência, contudo, ao risco, e não à incerteza.

[7] SACCO, Rodolfo. La Comparaison Juridique au Service de la Connaisance du droit. Paris: Economica, 1991, p. 7.

[8] TARUFFO, Michele. La Prueba. Tradução espanhola de Laura Manríquez e Jordi Ferrer Beltrán. Madrid: Marcial Pons, 2008, p. 253.

[9] Do ponto de vista da Ciência, aponta Otavio Luiz Rodrigues Junior, desde os escritos de Andrei Nikolaievich Kolmogorov (matemático russo que em 1932 publicou Grundbegriffe der Wahrscheinlichkeitsrechnung, obra seminal sobre a probabilidade), a causalidade “converteu-se em um caso específico de probabilidade”. Suas descobertas levaram a perceber que a probabilidade de um evento gerar determinado efeito é sempre superior a zero, consistindo uma contradição em termos a própria expressão “causalidade probabilística” (RODRIGUES, Otávio Luiz Junior. Nexo causal probabilístico: elementos para a crítica de um conceito. Revista de Direito Civil Contemporâneo, vol. 8, 2016, p. 115-127).

[10] Desfazendo a confusão terminológica, ver, por todos: TARUFFO, Michele. La Prueba. Tradução espanhola de Laura Manríquez e Jordi Ferrer Beltrán. Madrid: Marcial Pons, 2008, p. 30-31. E ainda em: TARUFFO, Michele. Uma simples verdade. O Juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula Ramos. São Paulo: Marcial Pons, 2012, p. 112-113.

[11] GROSSI, Paolo. “Il coraggio della moderazione”: specularità dell’itinerario riflessivo di Vittorio Polacco. Quaderni fiorentini per la storia del pensiero giuridico moderno, vol. 18, nº 1, 1989, p. 197-251.

[12] O arquivo consta do site do Senado Federal, na aba Comissão de Juristas responsável pela revisão e atualização do Código Civil: <https://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao?codcol=2630>. Último acesso em 18 de abril de 2024.

[13]Muito embora na 1ª Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, em 2002, tenha havido a aprovação de moção, proposta pela Comissão de Responsabilidade Civil elogiando o “notável avanço” e os “progressos indiscutíveis” da disciplina da responsabilidade civil no Código Civil de 2002. (Vide: IV Jornada de Direito Civil. Volume II. Organização Ministro Ruy Rosado de Aguiar Jr. Brasília: Conselho da Justiça Federal, 2007, p. 834. Disponível em:

https://www.cjf.jus.br/cjf/corregedoria-da-justica-federal/centro-de-estudos-judiciarios-1/publicacoes-1/jornadas-cej/IV%20Jornada%20volume%2011.pdf). Agradeço a referência aos Professores Rafael Pettefi e  Gisela Sampaio da Cruz Guedes.

[14] PASSOS, Edilenice; LIMA, João Alberto de Oliveira. Memória legislativa do Código Civil. Vol. III. Brasília: Senado Federal, 2012, p. 1-285.

[15] Art. 944-A, §3º: “Ao estabelecer a indenização por danos extrapatrimoniais em favor da vítima, o juiz poderá incluir uma sanção pecuniária de caráter pedagógico, em casos de especial gravidade, havendo dolo ou culpa grave do agente causador do dano ou em hipóteses de reiteração de condutas danosas”;

Art. 944-A, §4º: “O acréscimo a que se refere o §3º será proporcional à gravidade da falta e poderá ser agravado até o quádruplo dos danos fixados com base nos critérios do §§1º e 2º, considerando-se a condição econômica do ofensor e a reiteração d conduta ou atividade danosa, a ser demonstrada nos autos do processo”;

Art. 944-A, § 5º: “Na fixação do montante a que se refere o §3º, o juiz levará em consideração eventual condenação anterior do ofensor pelo mesmo fato, ou imposição definitiva de multas administrativas pela mesma conduta”.

[16] BODIN DE MORAES, Celina; GUEDES, Gisela Sampaio da Cruz; WESENDONCK, Tula. Perigos da quantificação do montante indenizatório no Anteprojeto, inédito. Ver, ainda: GUEDES, Gisela Sampaio da Cruz. O perigo das implicações sistêmicas provocadas por reformas legislativas: o exemplo da proposta de reforma do art. 942 do Código Civil. MARTINS-COSTA, Judith; MARTINS, Fábio; CRAVEIRO, Mariana; XAVIER, Rafael (Orgs.). Boletim IDiP-IEC. Vol. VII, Canela-São Paulo. Publicado em: 30.01.2024. Disponível em: https://canalarbitragem.com.br/vii-boletim-idip-iec/o-perigo-das-implicacoes-sistemicas-provocadas-por-reformas-legislativas-o-exemplo-da-proposta-de-reforma-do-art-942-do-codigo-civil/; WESENDONCK, Tula. Inquietações sobre as propostas apresentadas pela Comissão responsável pela revisão e atualização do Código Civil (CJCODCIVIL) na disciplina de Responsabilidade Civil. MARTINS-COSTA, Judith; MARTINS, Fábio; CRAVEIRO, Mariana; XAVIER, Rafael (Orgs.). Boletim IDip-IEC. Vol. X, Canela-São Paulo. Publicado em: 13.03.2024. Disponível em: https://canalarbitragem.com.br/x-boletim-idip-iec/inquietacoes-sobre-as-propostas-apresentadas-pela-comissao-responsavel-pela-revisao-e-atualizacao-do-codigo-civil-cjcodcivil-na-disciplina-de responsabilidade-civil/.

[17] In verbis: “Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários”. Vide, ainda: MICHELON, Cláudio. Direito Restituitório. Enriquecimento sem causa, pagamento indevido, gestão de negócios. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 184 e ss.

[18] “Art. 884, § 2º A obrigação de restituir o lucro da intervenção, assim entendida como a vantagem patrimonial auferida a partir da exploração não autorizada de bem ou de direito alheio, fundamenta-se na vedação do enriquecimento sem causa e rege-se pelas normas deste Capítulo.”

[19] “Art. 944, § 2º Em alternativa à reparação de danos patrimoniais, a critério do lesado, a indenização compreenderá um montante razoável correspondente à violação de um direito ou, quando necessário, a remoção dos lucros ou vantagens auferidos pelo lesante em conexão com a prática do ilícito.”

[20] Art. 942, §2º: “Havendo solidariedade, aquele que efetivar pagamento a prejudicado poderá exercer o direito de regresso contra os demais responsáveis, na proporção da sua participação para a causa do evento danoso”; Art. 945. “Se a vítima tiver concorrido para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a sua participação para o resultado em comparação com a participação do autor e de eventuais coautores do dano”. Outro exemplo, ainda, está no caput da proposta de inclusão do art. 944-B, segundo o qual: “[A] indenização será concedida, se os danos forem certos, sejam eles diretos, indiretos, atuais ou futuros”, dispositivo que está em flagrante contradição com o art. 403, segundo o qual: “Art. 403. Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual.”

[21] “Art. 927-B. Haverá obrigação de reparar o dano independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. § 1º A regra do caput se aplica à atividade que, mesmo sem defeito e não essencialmente perigosa, induza, por sua natureza, risco especial e diferenciado aos direitos de outrem. São critérios para a sua avaliação, entre outros, a estatística, a prova técnica e as máximas de experiência”.

[22]Assim concluem GUEDES e WESENDONCK, respectivamente, explicitando: “As novas funções sugeridas à responsabilidade civil, não parecem ser um mero aperfeiçoamento do texto, mas antes uma tentativa de resolver questões sociais muito complexas por meio da responsabilidade civil, como se a responsabilidade civil pudesse ser o “remédio” para todas as mazelas humanas. Se tal proposta for aprovada, inaugurada estará a era da pan-responsabilização, em que a solidariedade passará a ser a regra – e não mais a exceção” (GUEDES, Gisela Sampaio da Cruz. O perigo das implicações sistêmicas provocadas por reformas legislativas: o exemplo da proposta de reforma do art. 942 do Código Civil. MARTINS-COSTA, Judith; MARTINS, Fábio; CRAVEIRO, Mariana; XAVIER, Rafael (Orgs.). Boletim IDiP-IEC. Vol. VII, Canela-São Paulo. Publicado em: 30.01.2024. Disponível em: https://canalarbitragem.com.br/vii-boletim-idip-iec/o-perigo-das-implicacoes-sistemicas-provocadas-por-reformas-legislativas-o-exemplo-da-proposta-de-reforma-do-art-942-do-codigo-civil/); E ainda: “Para concluir, caberia lembrar a necessidade de coerência sistemática inerente ao Direito das Obrigações, do qual a responsabilidade civil é um capítulo. Uma reforma legislativa deve ser realizada de maneira cautelosa e equilibrada, sem atropelos e precipitações. Tome-se o exemplo da tentativa de reforma da responsabilidade civil no Código Civil francês, a partir dos anos 2000. Uma reforma não pode redundar na desagregação da ordem e unidade do Código Civil” (WESENDONCK, Tula. Inquietações sobre as propostas apresentadas pela Comissão responsável pela revisão e atualização do Código Civil (CJCODCIVIL) na disciplina de Responsabilidade Civil. MARTINS-COSTA, Judith; MARTINS, Fábio; CRAVEIRO, Mariana; XAVIER, Rafael (Orgs.). Boletim IDip-IEC. Vol. X, Canela-São Paulo. Publicado em: 13.03.2024. Disponível em: https://canalarbitragem.com.br/x-boletim-idip-iec/inquietacoes-sobre-as-propostas-apresentadas-pela-comissao-responsavel-pela-revisao-e-atualizacao-do-codigo-civil-cjcodcivil-na-disciplina-de responsabilidade-civil/. Ainda, dessas Autora e de Celina Bodin de Moraes: BODIN DE MORAES, Celina; GUEDES, Gisela Sampaio da Cruz; WESENDONCK, Tula. Perigos da quantificação do montante indenizatório no Anteprojeto, inédito.

[23] Essa é a ideia exposta por MICHELON, Claudio. Direito Privado, razão e justiça. São Paulo: Almedina, 2023.