Marcelo Trindade**

  1. Introdução

Em 17 de abril de 2014, a Comissão de Juristas encarregada da elaboração de um anteprojeto de revisão do Código Civil apresentou-o ao Senado Federal. Segundo a exposição justificativa que acompanhou o anteprojeto,[1] “[a] autonomia privada é prestigiada como um dos faróis do Direito Contratual”, ainda que, “nos casos de contratos não paritários”, o anteprojeto intervenha “para evitar abusos de direito”. Por isso, continua a justificativa, o anteprojeto faz “a distinção entre os contratos paritários e os não paritários, com o objetivo de evitar abusos nestes últimos”.

Assim, não há dúvida quanto aos objetivos do anteprojeto, no que toca aos contratos: prestigiar a liberdade contratual, assegurando o respeito ao conteúdo dos contratos que chamou de paritários – de maneira a limitar a intervenção pelo próprio Código e pelo juiz, que o interpreta e aplica – e, ao mesmo tempo, evitar abusos em contratos que denominou de não paritários. Diante desses objetivos, o anteprojeto utilizou uma ferramenta central: a distinção entre contratos paritários e não paritários.

Este artigo não pretende discutir a conveniência dos dois propósitos do anteprojeto quanto aos contratos, mas sim examinar se a estratégia por ele utilizada, baseada na distinção entre contratos paritários e não paritários, é sistemática e adequada ao alcance do resultado pretendido.

  1. Os contratos paritários no Código Civil

Foi a Lei de Liberdade Econômica (Lei 13.874/19) – editada cerca de cinco anos antes da apresentação do anteprojeto, mas movida pelo mesmo objetivo declarado de proteger a liberdade contratual –, que introduziu no Código Civil a distinção entre contratos paritários e não paritários, no art. 421-A, que acrescentou ao Código.[2]

Entre outras coisas, o art. 421-A do Código estabelece que, em contratos paritários, “a revisão contratual somente ocorrerá de maneira excepcional e limitada”. A afirmação era e é despicienda, dado ser essa a regra geral vigente para todos os contratos. Quem o diz, aliás, é o parágrafo único do art. 421 do Código Civil, acrescentado pela mesma lei, segundo o qual, “[n]as relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual”.

Assim, embora tenha causado certa perplexidade que o Código Civil fosse alterado para reafirmar que tanto no regime geral, aplicável a todas as relações contratuais privadas, quanto no regime específico dos contratos paritários, a revisão contratual era excepcional, tal redundância – que Anderson Schreiber chamou de “repetição pleonástica de expressões genéricas”[3] – era, a bem da verdade, irrelevante e provavelmente inofensiva.

Por outro lado, o inciso VIII do art. 3º da própria Lei da Liberdade Econômica tornava as coisas um pouco mais confusas, ao garantir que “os negócios jurídicos empresariais paritários serão objeto de livre estipulação das partes pactuantes, de forma a aplicar todas as regras de direito empresarial apenas de maneira subsidiária ao avençado, exceto normas de ordem pública”.

Isso porque a menção a negócios empresariais paritários, mas não a negócios civis paritários, poderia ser interpretada como um comando de aplicação aos primeiros não das normas do Código Civil – que unificou o direito das obrigações civis e empresariais no Brasil –, mas sim das tais “regras de direito empresarial” a que a norma fazia referência. Confusão agravada pela ressalva não dos regimes estabelecidos “em leis especiais”, como dizia o caput do novo art. 421-A, mas apenas das “normas de ordem pública” – coisas bem diferentes.[4]

De todo modo, a solução dessas dúvidas criadas pela Lei da Liberdade Econômica quanto ao tratamento dos contratos era simples: aquilo que a lei tratou ao mesmo tempo como exceção e regra deveria voltar a ser tratado apenas como regra, mantendo-se em vigor o parágrafo único do art. 421 do Código Civil, e revogando-se o art. 421-A e o inciso VIII do art. 3º da Lei da Liberdade Econômica.

  • A equivocada escolha do anteprojeto

Ocorre que o anteprojeto de Código Civil não apenas deixou de resolver como agravou o problema criado pela Lei da Liberdade Econômica. Nele, o parágrafo único do art. 421 é substituído por dois parágrafos, o primeiro dos quais passa a afirmar que “[n]os contratos civis e empresariais, paritários, prevalecem o princípio da intervenção mínima e da excepcionalidade da revisão contratual”.[5]

Assim agindo, o anteprojeto deixa claro que considera um erro do código vigente a afirmação, como regra geral, aplicável a todos os contratos, do “princípio da intervenção mínima” e da “excepcionalidade da revisão contratual”. A proposta do anteprojeto é que o princípio e a excepcionalidade se apliquem apenas à categoria dos contratos paritários, deixando todos os outros contratos no limbo. O que isso quer dizer? Que para todos os demais contratos, em que a presunção de paridade do art. 421-C do anteprojeto não se confirmar, a intervenção máxima será a regra, e a revisão a rotina?

Além de contrariar a própria natureza obrigatória dos contratos, essa pretensão é incompatível com as normas do vigente código civil que tratam da revisão contratual (arts. 317 e 478 a 480), que são confirmadas – e até mesmo aprofundadas[6] – pelo anteprojeto, sem que as alterações propostas para essas regras limitem sua aplicação aos contratos paritários – o que de fato seria, a nosso ver, um grave erro.

A escolha feita pelo anteprojeto é resultado, em primeiro lugar, do equívoco metodológico central que o permeia. O objetivo do anteprojeto, como ele deixa claro, era o de ampliar a liberdade contratual sem, contudo, permitir abusos em contratos não paritários. Só que o projeto fez o oposto: criou um regime especial de maior liberdade, aplicável apenas a contratos paritários, ao mesmo tempo em que, implícita ou explicitamente, restringiu a liberdade e agravou a insegurança jurídica para os demais contratos – ou seja, para o regime geral.

  1. Os contratos paritários no anteprojeto

O segundo equívoco do anteprojeto é sistemático. A summa divisio que adotou em tema de contratos, com repercussão central na maioria das suas propostas –a distinção entre contratos paritários e não paritários –, não é pacificada em doutrina.

Entre civilistas, a maioria afirma que são paritários os contratos “em que há livre negociação do seu conteúdo por ambas as partes”, em oposição aos contratos de adesão,[7] enquanto outros mencionam a equivalência de força negocial e o equilíbrio econômico entre as partes.[8]

Já entre os comercialistas há quem veja nos contratos paritários o oposto a “certas relações interempresariais” nas quais “verifica-se a dependência econômica de uma parte em relação a outra”, da qual decorre a “possibilidade/capacidade de um sujeito impor condições contratuais a outro, que deve aceitá-las”.[9]

Mesmo diante da incerteza doutrinária quanto ao conceito de contratos paritários, o anteprojeto não explicitou, na parte geral do Código Civil relativa aos contratos, os parâmetros destinados à distinção entre contratos paritários e não paritários. Quanto a eles sabe-se apenas que todos os contratos, civis ou empresariais, serão presumidos como paritários (e simétricos), “se não houver elementos concretos que justifiquem o afastamento desta presunção” (art. 421-C).[10]

Enquanto silencia quanto à identificação dos contratos paritários na parte geral, o anteprojeto refere-se fartamente a eles quando disciplina os contratos em espécie. Essas referências podem ser classificadas em algumas categorias. A mais populosa é composta por regras que afastam, para os contratos paritários, o regime geral, de maneira a conferir maior liberdade aos contratantes e a limitar a intervenção judicial nos contratos.[11]

Já o segundo conjunto de referências a contratos paritários é composto pelas regras que, supreendentemente, agravam a posição das partes nessa modalidade de contrato. Assim, por exemplo, o anteprojeto acrescenta um parágrafo à norma geral do caput do art. 762 do Código Civil – que estabelece a nulidade do contrato que tenha por objeto garantir risco “proveniente de ato doloso” –, para equiparar o dolo à culpa grave se o contrato for paritário. E, contraditoriamente, no § 2º acrescido ao art. 768 do Código atual, o anteprojeto permite que o contrato paritário afaste o agravamento intencional do risco como causa da perda de cobertura no seguro.[12]

Um terceiro conjunto de referências a contratos paritários é composto por normas que criam privilégios injustificáveis para partes em contratos paritários. Assim, por exemplo, o § 3º acrescido ao art. 1.422 do Código Civil permite apenas aos credores em contratos paritários ceder “seu grau de prioridade a outro credor garantido sobre o mesmo bem”. E o § 2º acrescido ao art. 1.431, admite que apenas nos contratos paritários o bem empenhado possa permanecer na posse do devedor.[13]

Finalmente, um último e talvez mais problemático conjunto de referências a contratos paritários é composto por normas assistemáticas, que criam insegurança jurídica sobre o regime aplicável aos demais contratos. Exemplos dessa espécie são o § 2º acrescentado ao art. 599 do Código, para estabelecer que o “contrato paritário de prestação de serviços admite cláusula de resilição unilateral, mesmo quando fixado sem tempo determinado”. Ocorre que a regra geral aplicável a todos os contratos, por força da interpretação do atual art. 473 do Código Civil – nesse ponto não alterado pelo anteprojeto – é a de que os contratos por tempo indeterminado podem ser unilateralmente denunciados.

A intenção do anteprojeto teria sido dizer “com tempo determinado” no lugar de “sem tempo determinado”? Essa interpretação faria da regra especial norma inútil, dado que o anteprojeto, com a inclusão de um § 4º no art. 472 do Código, parece pioneira e perigosamente admitir, como parte do regime geral, a resilição unilateral destinada “a extinguir contrato celebrado por tempo determinado”, caso em determina que “o prazo de suspensão dos seus efeitos não poderá ser superior ao próprio prazo remanescente originalmente pactuado pelas partes.”

No contrato de corretagem, o anteprojeto estabelece que a obrigação de pagar ao corretor é daquele que comprovadamente o contratou, salvo estipulação em contrário em contrato paritário (§ 1º acrescido ao art.725). Isto quer dizer que nos demais contratos a parte que não contratou o corretor também responde pela obrigação?

Nos contratos de transporte, atualmente é permitido ao transportador “exigir declaração do valor da bagagem a fim de fixar o limite da indenização” (Código Civil, art. 734, parágrafo único). O anteprojeto altera a norma para limitar essa possibilidade aos contratos paritários. Nos outros casos a indenização não poderá ser limitada?

A verdade é que todos esses exemplos deixam clara a atecnia do anteprojeto no tratamento dos contratos, relacionadas com suas referências espasmódicas, equívocas e assistemáticas a contratos paritários.

  1. Os contratos de adesão no anteprojeto

É preciso, por fim, não deixar sem nota o fato de que, ao lado dos contratos paritários, o anteprojeto lança mão de outra classificação, para criar outro regime especial, relativo aos contratos de adesão. Nesse caso, contudo, o anteprojeto, além de afastar a incidência de normas aplicáveis a certos contratos em espécie, caso se formem por adesão, também oferece os critérios que permitem distingui-los dos demais contratos – ao contrário do que fez nos contratos paritários. O que talvez se explique por se tratar, no caso dos contratos de adesão, de tema com mais de cem anos de investigação doutrinária.

Assim, antes de cuidar dos contratos em espécie, o anteprojeto dá ao art. 423 do Código Civil nova redação, para informar que “[a] expressão ´contrato de adesão´ engloba tanto aqueles cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente, como aqueles em que as cláusulas sejam estabelecidas unilateralmente por um dos contratantes, sem que o aderente possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo”. Como se vê, trata-se do conceito de contrato de adesão amplamente adotado pela doutrina.

Como o anteprojeto detalha as características dos contratos de adesão e cria para eles uma disciplina própria, ainda que espalhada em diversas normas, poder-se-ia cogitar de que ele teria querido opor contratos paritários a contratos de adesão. Mas neste caso, provavelmente teria usado esta última expressão, e não contratos não-paritários, como a antagônica aos contratos paritários.

De todo modo, o anteprojeto cria um regime jurídico próprio para contratos de adesão, ainda que o faça de maneira esparsa. Com normas gerais determina que as cláusulas dos contratos de adesão devem ser “redigidas em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, de modo a facilitar a sua compreensão pelo aderente” (art. 423, § 1º) e, repetindo o Código, ser interpretadas “de maneira mais favorável ao aderente” (art. 423, § 2º).

Já no tratamento dos contratos em espécie, o anteprojeto dispõe que nos contratos de depósito celebrados por adesão é nula “a cláusula de limitação ou de exclusão da responsabilidade do depositário” (art. 629, paraágrafo único). Nos contratos de fiança por adesão, declara nulas “as cláusulas de renúncia ao benefício de ordem ou de imposição de solidariedade ao fiador” (art. 828, III) e, em quaisquer contratos de adesão, “a cláusula de renúncia antecipada ao direito de indenização e retenção por benfeitorias necessárias pelo possuidor de boa-fé” (art. 1.219, § 3º). Finalmente, assegura ao “aderente pleitear perdas e danos complementares, desde que comprove prejuízos que excedam ao previsto na cláusula penal”, mesmo que tal direito não esteja contratualmente assegurado (art. 416, § 2º).

  1. Conclusão

O anteprojeto ignora, quanto aos contratos, o sistema do Código Civil e do ordenamento como um todo. Introduz, para os contratos paritários, um regime que ao mesmo tempo presume aplicável a todos os contratos, que manda interpretar pelas regras do Código, “ressalvados os regimes jurídicos previstos em leis especiais” (art. 421-C), mas que trata como especial, por meio de dezenas de normas de exceção ao regime geral.

Por outro lado, tudo isso é feito sem nem mesmo explicitar minimamente os mecanismos para a identificação daqueles contratos paritários, ignorando-se o fato de que se trata de conceito não sedimentado em doutrina.

A única certeza a que se chega após o exame da proposta é que seria extremamente danoso para o país dar início ao processo de discussão legislativa de um anteprojeto que falha tão claramente no método utilizado para alcançar seus objetivos. Como está, além de fracassar em atingi-los, causará graves e maléficos efeitos colatera

** Advogado. Professor no Departamento de Direito da PUC-Rio.

[1] Disponível em https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento/download/68cc5c01-1f3e-491a-836a-7f376cfb95da, consulta em 07.06.2024

[2] É farta a bibliografia sobre a Lei das Liberdade Econômica. Para uma crítica aprofundada, consulte-se Martins-Costa, Judith; Nitschke, Guilherme Carneiro Monteiro (Coord.). Direito Privado na lei da Liberdade Econômica: Comentários. São Paulo: Almedina, 2022.

[3] SCHREIBER, Anderson [et al.]. Código civil comentado: doutrina e jurisprudência. Rio de Janeiro: Forense, 4ª ed., 2022, p. 301.

[4] Para Anderson Schreiber, entretanto, “a distinção não produz qualquer consequência no âmbito do próprio art. 421-A, que deixou de reservar efeitos diferentes para uma ou outra das supostas espécies de contrato. Trata-se, na verdade, de um resquício de versões anteriores do projeto de lei, que diferenciavam as duas espécies e foram duramente criticadas pela doutrina antes da publicação da versão final da Lei da Liberdade Econômica” (SCHREIBER, Anderson [et al.], ob. e loc. cit.).

[5] A vírgula enigmática, que aparece depois da palavra empresariais, parece atribuir a característica de paritários a todos os contratos civis e empresariais, embora a norma atualmente vigente, do art. 421-A, segundo a qual os contratos civis e empresariais apenas “presumem-se paritários e simétricos”, tenha sido reproduzida no art. 421-C pelo anteprojeto.

[6] Incidindo, ao fazê-lo, a nosso ver, em diversos equívocos, que não cabe aqui comentar.

[7] TEPEDINO, Gustavo. KONDER, Carlos Nelson. BANDEIRA, Paula Greco. Fundamentos do Direito Civil, volume 3. Contratos. Rio de Janeiro: Forense, 3ª ed., 2020, p.79. E prosseguem os autores, quanto ao regime aplicável aos contratos paritários: “Nos contratos paritários, nas tratativas que antecedem a celebração do contrato, poderão as partes, portanto, submeterem-se aos elementos naturais” – que, como explicam, “são aqueles previstos pelo legislador, ou incorporados à normativa contratual pelas práticas contratuais, que terão incidência desde que não afastados pela autonomia privada” – “ou afastá-los. Já nos contratos de adesão, suprimida a negociação preliminar, nega-se a possibilidade de introdução unilateral por uma das partes de regra destoante da disciplina usualmente praticada” (p. 80). No mesmo sentido a clássica lição de Darcy Bessone, atribuindo a Saleilles a origem da classificação (BESSONE DE OLIVEIRA ANDRADE, Darcy. Aspectos da evolução da teoria dos contratos. São Paulo: Saraiva, 1949). Hoje é esta classificação que está refletida no art. 1110 do Código Civil francês, que diferencia o “contrat de gré à gré”, “celui dont les stipulations sont négociables entre les parties” e o “contrat d’adhésion”, “celui qui comporte un ensemble de clauses non négociables, déterminées à l’avance par l’une des parties”.

[8] Anderson Schreiber parece de fato enxergar na expressão “paritários e simétricos” do art. 421-A do Código Civil uma referência à “igualdade de forças entre os contratantes”, ressaltando que a “eventual caracterização da vulnerabilidade de um dos contratantes continua a afastar tal presunção, sempre relativa” (SCHREIBER, Anderson [et al.], ob. e loc. cit.). Já Roberto Braga de Andrade que a expressão “contratos paritários” “[q]uer indicar a existência de um equilíbrio econômico entre as partes (igualdade real), diferentemente dos contratos oriundos de relações de consumo, em que, normalmente, o consumidor, parte economicamente mais fraca, carece de poder de barganha e limita-se a aderir ou não às condições preestabelecidas pelo fornecedor.” (ANDRADE, Roberto Braga de. Reflexões sobre as tratativas nos contratos paritários de conteúdo complexo. In Doutrina essenciais: Obrigações e contratos. TEPEDINO, Gustavo e FACHIN, Luiz Edson (Org.), São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 260).

[9] FORGIONI, Paula Andrea. Contratos Empresariais. Teoria Geral e Aplicação. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 6ª ed., 2021, p. 67 – destaque do original. E prossegue a autora: “A concepção de contrato paritário liga-se a relações equilibradas, em que certa igualdade das empresas é fator determinante na organização e desenvolvimento das fases do negócio, desde o ajuste inicial, passando pela execução, criação intermediária de obrigações, até sua extinção. Embora a absoluta simetria seja rara, nos contratos paritários a dinâmica do processo de negociação e de execução contratual desenvolve-se sem a marcada preponderância dos interesses de um dos polos” (p. 67). Note-se que a autora, na mesma obra, opõe os contratos de adesão ao que denomina “contratos negociados” (p. 65), podendo-se concluir que os contratos paritários são modalidades destes últimos, como também podem ser os contratos com dependência econômica.

[10] Inclusive os contratos de seguros de grandes riscos, que também “se presumem paritários e simétricos” (art. 757-A) mas, por qualquer razão, mereceram especial deferência, quando de seu tratamento entre os contratos típicos.

[11] São dessa primeira modalidade, por exemplo, as normas autorizando que as partes em contratos paritários disponham sobre a prova dos negócios jurídicos em geral (art. 212, § 2°), o aumento da penalidade legal pela denúncia do contrato de prestação de serviços pelo tomador (art. 603, parágrafo único) e a limitação e a exclusão da responsabilidade do depositário pela guarda e conservação da coisa (art. 629, parágrafo único), ou afastem a revisão da cláusula penal, salvo na forma pactuada (art. 413, parágrafo único) e a revisão do preço no contrato de empreitada (art. 620, parágrafo único).

[12] Ainda tratando do contrato de seguros, o anteprojeto impõe somente ao segurado em contrato paritário o dever de informação sobre as “circunstâncias e fatos que ele sabe ou deveria saber que têm potencial de agravar o risco segurado, sob pena de perder o direito à garantia” (art. 766, § 2º), como se aquele dever não decorresse da boa-fé que informa todo contrato de seguro.

[13] Sobre o tema da indevida criação de privilégios legais sem fundamento nos valores constitucionais, peço licença para citar TRINDADE, Marcelo. Contrato, Status e a Lei de Liberdade Econômica in Arbitragem e outros temas: Homenagem a Pedro A. Baptista Martins. TOLENTINO, Augusto MOURA, Bernard Potsch e MARTINS, Julia Girão Baptista. São Paulo: Ed. Quartier Latin, 2023.